Por Ivênio Hermes
Interesses em Jogo
A Proposta de Emenda Constitucional 37/2011 – PEC 37 ganhou vulto nos
últimos meses desde sua aprovação pela Câmara dos Deputados. A emenda atribui a
competência para investigar crimes exclusivamente às policias Federal e Civil,
segundo seus defensores, apenas reforçaria o que estaria previsto originalmente
na constituição de 1988.
Diante dessa premissa inicial surge o embate pela competência de
investigar, tendo de um lado, devidamente entrincheirados, Promotores e
Procuradores de Justiça representando o Ministério Público e do outro lado
Delegados Civis e Federais representando a Polícia Judiciária. Contudo, no meio
dessa guerra está a sociedade que pode sofrer com as consequências de uma
decisão premeditada e acalorado pelo orgulho do exercício glamoroso de uma
função pública.
Os interesses da sociedade brasileira devem vir em primeiro lugar e
ambas partes litigantes nesse processo devem repensar exatamente o que desejam.
Partes Ligantes
Acusados de um discurso corporativista enquanto alegam a busca pela
defesa de sua competência em investigar, os delegados vivem o dilema nacional
da falta de efetivo, estrutura e autonomia (funcional e orçamentária)
necessária para agir nos casos sob suas circunscrições.
Nenhum estado brasileiro possui número suficiente de delegados, agentes
e escrivães de Polícia Civil para atenderem a demanda dos crimes que acontecem
dentro dos limites de seus estados.
Os próprios gestores públicos, muitos oriundos da carreira de delegado,
em alguns estados tem se mostrado inertes diante da ingerência do poder
executivo nas atividades de controle da Polícia Civil, como distribuição de
equipes de investigação (delegados, agentes e escrivães), falta de postura na
contratação de concursados, na solicitação de novos concursos, enfraquecendo a
estrutura regimentar da instituição.
A fraqueza impede que essa polícia tenha autonomia para realizar seu
trabalho, inclusive no que pertine à própria conduta dos membros eleitos do
poder executivo, abrindo precedentes para a ação investigativa do Ministério
Público.
A ineficácia das polícias em combater a corrupção e a impunidade suscitou
no Ministério Público a vontade de levantar esse estandarte.
Um dos grandes momentos que comprovou que o Ministério Público poderia
contribuir de forma muito eficaz para a solução de crimes foi quando a Polícia
Civil concluiu precipitadamente as investigações do Caso Celso Daniel como
sendo sequestro seguido de morte. Porém, quando refeita a investigação pelo MP,
em parceria com as polícias, muita coisa veio à tona.
Ocorre que o Ministério Público também sofre acusações de elitizar suas
investigações, isto é, de escolher apenas aquelas que dão mais publicidade ao
trabalho que ele realiza, numa grande propaganda institucional, deixando de
direcionar esforços para a elucidação de crimes de homicídios comuns, por
exemplo. Algumas acusações parecem ser verdadeiras, outras, porém, não são,
pois alguns tipos de ações criminosas parecem estar fora do alcance da polícia,
como por exemplo, os crimes contra o patrimônio público e crimes eleitorais
praticados por grandes e poderosos e que as polícias não conseguem chegar perto
em virtude de sua subordinação ao governo dos Estados.
A Polícia Federal não possui toda a autonomia que a mídia tendenciosa
alardeia. O órgão também é carente de efetivo. Desde 1973 o Conselho Superior
da Polícia Federal estabeleceu que o contingente da corporação precisaria de 15
mil homens e após 41 anos só há 13 mil homens com 1700 delegados.
Para fundamentar sua autonomia em investigar, a Polícia Federal surge
agora com plano mais ousado, surgindo com uma proposta totalmente inovadora que
reestrutura a PF trazendo dentre as principais diretrizes:
1. A desvinculação da
PF da estrutura do Ministério da Justiça para sua transformação em uma Agência,
adotando modelo da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
2 A escolha do
diretor-geral a partir de uma lista tríplice;
3 Mandato
preestabelecido para o diretor-geral e;
4. Sessão de
questionamentos no Senado Federal para referendar a nomeação desse
diretor-geral.Como ficaria, entretanto, a situação da Polícia Civil? Continuaria subordinada ao Governo do Estado? Ou ficaria agora subordinada à “Agência de Polícia Federal”?
Não há como evoluir no sistema policial brasileiro sem dar vazão ao pensamento de uma polícia fortalecida e nisso a Polícia Federal está correta em buscar mais autonomia, sem, contudo, ficar completamente sem subordinação ao chefe do Estado brasileiro. Mister se faz analisar, o caso das Polícias Civis que padecem nos estados, encontrando soluções mais facilmente exequíveis como a criação de um Ministério da Segurança Pública, onde as polícias ficariam alinhadas mais diretamente a um gestor federal, saindo da influência imediata dos governos estaduais.
Combate ao Crime
O fato atual e inegável é que o Brasil é uma grande piada em se tratando
de punir criminosos que roubam os cofres públicos. Nem o Ministério Público e
nem a Polícia Judiciária conseguem combater de forma eficaz os crimes cometidos
pelos políticos que roubam o povo.
São frequentes as operações que prendem, retiram do cargo e criam um
furor midiático que parece satisfazer o brasileiro de memória curta que não
cobra resultados.
Bandidos travestidos de terno e gravata continuam desfilando e sendo
presos brevemente e levam tanto tempo para serem julgados, que esfria o clamor
público e o escândalo cai no ostracismo das mentes de um povo que somente quer
saber quando será o próximo carnaval fora de época ou a próxima partida de
futebol.
Os maiores criminosos do Brasil andam soltos e se divertem com a briga
entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público sobre quem deve ou não
investigar, enquanto o certo deveria ser conclamar a sociedade civil em
campanhas de esclarecimento sobre a situação de falta de investimento na
Segurança Pública e a falta de horizontes para a solução dos crimes enquanto
dois fortes componentes continuarem a se digladiar para ver quem senta no trono
do poder de investigar.
É necessário que o bem social seja colocado em primeiro lugar, que haja
um conclave entre representantes do Ministério Público e das Polícias
Judiciárias no sentido de unir forças sem qualquer vaidade institucional para
juntos apresentarem um novo projeto que traga benefício à sociedade brasileira
e finalmente que se proponham ações concretas contra corruptos e corruptores no
Brasil.
Chega de somente punir policiais e agentes da lei como bodes expiatórios
quando existem ações de combate à corrupção, chega de vermos políticos fazerem
e acontecerem, defraudarem os cofres públicos e engordarem suas contas
bancárias e no máximo perderem seus privilégios para voltarem alguns anos
depois e fazerem a mesma coisa.
Que o Ministério Público e a Polícia Judiciária entendam que precisamos
de um sistema de investigação forte e sem influências, do contrário, somente as
minorias continuarão pagando por crimes que às vezes nem cometeram e nunca
teremos o efetivo combate ao crime no Brasil.
Fonte: Blog Retrato do Oeste